Debater a Justiça - Construir o Programa Eleitoral

José Neto
 

José Neto

Os problemas da Justiça continuam na ordem do dia, quase sempre, infelizmente, pelas piores razões. São os problemas de uma justiça lenta e cara, de casos recorrentes e cada vez mais frequentes de uma justiça desigual, de indevidas intromissões exteriores, enfim, de uma justiça que não realiza os princípios constitucionais consagrados na Constituição da República sobre esta matéria. 
Foi neste quadro que, por iniciativa e a convite do Secretário Geral do PCP, se encontraram, há dias, num jantar em Lisboa, algumas personalidades da área da justiça. Na origem do convite esteve o interesse na troca de opiniões e na auscultação de prestigiados juristas, advogados e magistrados que acompanham e vivem os problemas da justiça.
Por outro lado, e no contexto  da elaboração do Programa eleitoral do Partido, o encontro, que decorreu em ambiente muito cordial, revelou-se de grande utilidade para a recolha de opiniões e sugestões de trabalho nesta área tão importante para a defesa do regime democrático. 
Quatro grandes questões estiveram em cima da mesa de discussão.
A primeira, mais geral, dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, e que tem a ver com a já extensa lista de casos de violação dos direitos de reunião, expressão e manifestação, que envolvem não só as forças policiais mas igualmente, e o que é mais preocupante, magistrados e tribunais, muitas vezes acusando e punindo, de forma pouco razoável, cidadãos que exercem direitos no quadro da Constituição e da lei. 
A segunda, a justiça laboral. São muitas e justificadas as preocupações com o debilitamento, a que se assiste, dos Tribunais de Trabalho – fecho de secções, retirada de juízes, acumulação de processos, pendências aos milhares. Sobretudo no contexto desta gravíssima crise económica e social, com as consequências dramáticas que se conhecem – encerramentos, salários em atraso, despedimentos, e com a entrada em vigor do celerado Código do Trabalho do Governo e dos patrões. 
Depois, o acesso à justiça e o apoio judiciário, ou a falta dele. Sintoma claro de que o Estado se vai progressivamente desresponsabilizando das suas funções, também nesta área. Os cidadãos são afastados dos tribunais, por via de uma justiça, que devendo ser tendencialmente gratuita, tem custos cada vez mais inacessíveis. Situação que piora com o novo Mapa judiciário e com a crescente “oferta” de formas privadas de resolução de conflitos, de recurso quase obrigatório. 
Por fim, mas como questão nuclear, a independência do Poder judicial. Como noutros sectores do Estado, sucedem-se as tentativas de governamentalização da Justiça, quer por via de legislação, quer por interferências mais ou menos claras e directas do poder político no judicial e nas magistraturas, nomeadamente o Ministério Público, visando limitar a sua autonomia para melhor controlar a investigação criminal e garantir que continua impune a criminalidade mais grave ligada ao poder político e económico. A separação de poderes e da independência dos tribunais estão longe de estar garantidas. A sua preservação e defesa não pode ser descurada, como questão central do regime democrático.