Intervenção de António Avelãs Nunes, Mandatário da CDU
António Avelãs Nunes na apresentação da Lista da CDU ao Parlamento Europeu
30 de Março de 2009
ImageEntendeu a Comissão Coordenadora da CDU que eu poderia ser o mandatárionacional da nossa candidatura às próximas eleições para o PE. Eulimitei-me a aceitar a missão que me foi atribuída, com a promessa decumprir o melhor possível e com a esperança de poder honrar a confiançaem mim depositada.

Queridos Amigos e Camaradas da CDU

Militantes do PCP, do Partido Ecologista Os Verdes e da Intervenção Democrática,
Cidadãos sem ligação partidária, como eu

1. - Entendeu a Comissão Coordenadora da CDU que eu poderia ser o mandatário nacional da nossa candidatura às próximas eleições para o PE. Eu limitei-me a aceitar a missão que me foi atribuída, com a promessa de cumprir o melhor possível e com a esperança de poder honrar a confiança em mim depositada.

É uma tarefa que cumpro com agrado. Por todas as razões que sempre nos animam quando sabemos estar a combater o bom combate, do lado certo da barricada. Mas também porque sou mandatário de uma boa lista de candidatos. Não me fica mal dizer que é a melhor lista de todas as que vão apresentar-se a estas eleições.

Em 1º lugar, porque ela traz consigo um património consistente de reflexão e de luta, que nenhuma outra poderá apresentar.

- Uma reflexão crítica sobre o que tem sido o processo de integração europeia e o que é esta Europa do capital, este santuário do neoliberalismo, laboriosa e manhosamente construído ao longo de décadas, sempre nas costas do povo, o povo ignaro que dizem não estar preparado para aprovar por referendo os tratados sabiamente elaborados pelas elites iluminadas e que, ainda por cima, do alto da sua ignorância, às vezes se lembra de dizer que não quer tais tratados nem tal Europa.

- Um património de luta dos trabalhadores portugueses e dos trabalhadores europeus contra esta Europa assente no dumping salarial, no dumping fiscal, no dumping social, no dumping ambiental, no sacrossanto direito à livre circulação dos capitais e à libérrima deslocalização de empresas; esta Europa de cócoras perante o império norte-americano, cúmplice e parceira das aventuras criminosas da Administração Bush e dos seus fiéis aliados deste lado do Atlântico.

Em 2º lugar, ela é a melhor lista também porque é constituída por 16 mulheres e 14 homens com presença destacada nos mais importantes sectores da vida nacional, na indústria e nos serviços, na pesca e na agricultura, na educação, na medicina e na investigação científica.

Como primeiro nome, a deputada Ilda Figueiredo, uma militante e dirigente política que tem honrado todos os cargos que desempenhou, sempre presente nos locais onde se luta pelos direitos e pela dignidade dos trabalhadores, sempre a intervir, no PE e em outros órgãos de representação política, na defesa, lúcida e corajosa, dos pontos de vista da esquerda.

Vêm depois outras pessoas ligadas ao mundo do trabalho, dirigentes sindicais com prestígio firmado, jovens cientistas, professores, operários, médicos, pessoas de cultura. De entre eles, deixem-me destacar a figura mais respeitada, à escala mundial, da cultura portuguesa: José Saramago. Mais uma vez contamos com ele. Mais uma vez ele aí está, ao lado dos trabalhadores portugueses, a dizer-lhes: contem comigo!

Esta é uma lista que aposta em quadros jovens, porque a CDU vem sendo, cada vez mais, o espaço dos jovens, dos jovens trabalhadores, dos jovens estudantes, dos jovens agricultores, dos jovens cientistas, dos jovens de todo o País. Porque a CDU é um espaço aberto de gente livre e responsável que quer estar na política para defender os interesses de Portugal e de todos os portugueses que vivem do seu trabalho. São estes os interesses que os nossos candidatos defenderão no PE!

2. - Estas eleições vão decorrer no meio de uma grave crise económica e social. Dizem todos os defensores do capitalismo – incluindo os dirigentes da social-democracia europeia, adeptos da chamada economia social de mercado ou economia de mercado regulada – que esta é uma crise do neoliberalismo, querendo deixar a ideia de que ela não é uma crise do capitalismo. A solução estaria em abandonar o neoliberalismo, porque o capitalismo é eterno.

Insinua-se por vezes que, em boa verdade, se trata de uma espécie de crise de costumes, fruto da actuação desregrada e imoral de uns quantos gestores da alta finança. A Chanceler alemã chegou a dizer que a crise resultou de “excessos do mercado”, coisa que ninguém esperaria de uma instituição tão natural, tão espontânea, tão insubstituível, tão infalível, tão respeitável. A solução residiria em introduzir a ética no mercado, em impor a moral nos negócios, em regular o mercado para que este se porte bem e não volte a cometer excessos.
Por nós, sabemos há muito – desde os escritos de Malthus, antes de Marx – que as crises são inerentes ao capitalismo, que o capitalismo, enquanto existir, há-de sempre passar por ciclos alternados de crescimento económico e de depressão. Marx explicou tudo isto muito bem. E Keynes reconheceu que, nas sociedades capitalistas, as situações de pleno emprego são raras e efémeras.

Esta é, pois, mais uma crise do capitalismo. Não será a última, mas ela ajudará a enfraquecer ainda mais este corpo condenado a morrer (como tudo o que é histórico) e a dar lugar a um mundo diferente, apesar de todos os meios – e são muitos, não nos iludamos – que podem ainda prolongar-lhe a vida.

Em geral, os dirigentes socialistas e sociais-democratas da Europa estão entre os que, fazendo cara séria de gente de esquerda, vêm agora dizer: o neoliberalismo morreu, o mundo não poderá continuar a ser o que foi nas últimas décadas. Há-de continuar a ser um mundo capitalista, é claro, mas agora adocicado graças às receitas da farmácia keynesiana, que desde os anos 70 do século passado eles declararam fora de moda, proclamando, em coro afinado com todos os neoliberais, a morte de Keynes. Porque, apesar de não ser um revolucionário e de nunca se ter afirmado socialista, Keynes veio recordar ao mundo o que ele considerava os dois vícios fundamentais do capitalismo e a necessidade de os combater seriamente (para salvar o próprio capitalismo):

- a possibilidade de ocorrência de situações de desemprego involuntário;

- as enormes desigualdades na distribuição do rendimento, que dificultam o desenvolvimento económico e potenciam o desemprego.

- Em ambos os casos, pondo em causa a ‘paz social’ indispensável ao funcionamento do capitalismo dentro das regras da democracia política.

3. - Os socialistas-sociais-democratas europeus – entre os quais os socialistas portugueses – são os principais responsáveis pela construção desta Europa condenada à falência, porque é uma Europa contra o futuro, porque é uma Europa negadora das duras lutas dos trabalhadores europeus para conquistarem os direitos que hoje lhes assistem (e tiveram de conquistá-los todos, é bom recordá-lo, desde o direito de voto, que a burguesia começou por negar-lhes, até à liberdade de constituir sindicatos, que começou por ser qualificada e tratada como crime).

Os construtores desta Europa privatizaram tudo, desregulamentaram tudo, entregaram ao grande capital a produção e a distribuição de bens e serviços essenciais á vida das pessoas (incluindo a água!). Confiaram tudo à lógica do mercado, ao mercado que juram ser um mecanismo natural, único critério de racionalidade e de justiça (“o que é natural é justo”, diziam os fisiocratas no século XVIII), cujas soluções são infalíveis, indiscutíveis, para além do justo e do injusto.

Por outras palavras: entregaram tudo aos especuladores, aos grandes jogadores da economia de casino, bem protegidos pela soberania intocável dos paraísos fiscais (também chamados, a justo título, estados bandidos ou estados mafiosos).

Para calar a consciência, importaram da América as agências reguladoras independentes (que não são independentes e, pelos vistos, não regulam nada…), amputando o estado democrático deste último reduto da soberania: a defesa dos interesses públicos inerentes à produção e ao comércio dos bens e serviços essenciais à vida. Decisões políticas importantes, que afectam a vida de milhões de pessoas, são cometidas a estas agências, que, em nome da sua pseudo-independência e da sua pseudo-competência, actuam sem prestar contas aos órgãos políticos legitimados democraticamente e escapam ao controlo do povo soberano através do voto por sufrágio universal.

Agora, dizem – parece que espantados – que a regulação falhou, que a supervisão falhou… E não há como pedir responsabilidades a ninguém, porque, por definição, os reguladores são competentes e são independentes, e não respondem politicamente perante ninguém.

Vale a pena perguntar: alguém de boa fé poderia esperar outra coisa? O insuspeito dirigente socialista francês Michel Rocard escreveu, em 2003 sem mais nem menos, o que vou ler: “Numa economia mundialmente aberta não há lugar para a regulação”. Assim mesmo. Louvemos-lhe a franqueza (outros dirão a desfaçatez) com que nos diz o que outros calam: a regulação é um embuste, não é para levar a sério, porque dela não resulta nada, nem pode resultar.

O que é verdade é que o estado regulador cumpriu o seu papel de deixar o campo aberto à livre circulação de capitais, à livre criação de produtos financeiros derivados, inventados com todo o carinho dos seus criadores para alimentar as apostas no casino em que transformaram o mundo. Trata-se de ‘produtos’ (designação falsa, enganadora e nada inocente) virtuais, cujo valor global se calcula corresponda ao equivalente a vinte anos da produção mundial, mal conhecidos (mesmo pelos habituais frequentadores deste casino, como os bancos), que servem apenas para a especulação e que ameaçam transformar-se, segundo alguns especialistas, em “armas de destruição maciça”.

4. - Já antes, em 1995, no rescaldo da grave crise da moeda mexicana (que ameaçou o sistema financeiro norte-americano e mundial, em virtude do famoso risco sistémico – “maior a nau, maior a tormenta”, como diz o nosso povo), o Presidente francês Jacques Chirac classificou os especuladores como “a sida da economia mundial”.

Fizeram alguma coisa para combater esta sida? É claro que não. Passado o susto, tudo regressou ao paraíso. Crise após crise, acumulando desemprego, desigualdade crescente e exclusão social, trabalho precário, com salários baixos e cada vez menos direitos, a sida tomou conta da economia mundial.

Detectada a doença, o que fizeram? Nacionalizaram a banca e os seguros, para evitar que as poupanças e as pensões de quem trabalha continuem a ser jogadas em jogos de casino, à margem de todas as regras do jogo, por mais permissivas que elas sejam? Não. Entregaram e entregam todos os dias milhões e milhões aos mesmos que criminosamente esbanjaram o que não lhes pertence, para que eles possam continuar a sua vidinha boa de jogadores de casino. É a velha receita dos que pensam que ferida de cão se cura com o focinho do mesmo cão… O estado capitalista mostra de novo a sua face e a sua verdadeira natureza de classe.

Quanto a nós, pensamos que

- se a saúde do sistema financeiro, nomeadamente do sistema bancário, é essencial à saúde da economia e à salvaguarda da coesão social e, no limite, à defesa da soberania nacional (evitando a bancarrota do estado);

- se, por isso mesmo, quando os banqueiros-jogadores-de-casino levam os bancos à falência, o estado é chamado a investir milhares de milhões de euros (em nome do interesse público, diz-se),

- então a única conclusão lógica que podemos extrair destas premissas é a de que deve caber ao estado a propriedade e a gestão do sistema financeiro, a gestão da poupança nacional e a definição das prioridades de investimento a realizar com ela.

5. - A estes defensores da economia de mercado regulada, que hoje renegam os dogmas do neoliberalismo que ontem defendiam e aplicavam com o fervor dos neófitos, impunha a coerência que pusessem em causa esta Europa-monumento-ao-neoliberalismo,

- esta Europa construída, em grande parte, por obra dos dirigentes socialistas e sociais-democratas europeus, quase sempre à custa de conciliábulos entre ‘elites’, retirando à ponderação do voto popular as opções de fundo tomadas,

- esta Europa que, na linguagem da Geografia Física, poderíamos definir como uma bacia hidrográfica em que todos os rios vão ter ao mesmo lago sem saída do neoliberalismo.

Que Europa é esta? É:

- a Europa cujos Tratados consideram liberdades fundamentais não os clássicos direitos, liberdades e garantias ou os direitos económicos, sociais e culturais (o direito ao trabalho, o direito à saúde, o direito à educação e à habitação, o direito a uma velhice digna), mas (transcrevo) “a livre circulação de pessoas, serviços, mercadorias e capitais, bem como a liberdade de estabelecimento”: ou seja, a Europa que toma como liberdades fundamentais as liberdades do capital;

- a Europa do mercado livre para o capital (o tal mercado que, pelos vistos, se portou mal, cometendo excessos);

- a Europa da concorrência livre e não falseada;

- a Europa de Maastricht, do Pacto de Estabilidade e Crescimento;

- a Europa do Banco Central Europeu, o mais independente e fiel aos dogmas do neoliberalismo em todo o mundo, completamente desligado da economia real e da vida das pessoas;

- a Europa que privatizou todos os sectores estratégicos, a banca e os seguros;

- a Europa que liquidou a tradição centenária dos serviços públicos à margem do mercado, não os considerando nem um valor nem um objectivo da União, limitando-se os Tratados a dizer esta coisa ridícula: serviços públicos são “serviços a que todos na União atribuem valor” (e se têm valor, concluem eles, devem estar no mercado, porque são um óptimo negócio, capaz de encher os bolsos dos grandes beneficiários do mercado interno único);

- a Europa que sempre recusou a definição de uma política de pleno emprego e de combate ao desemprego (porque esse é um assunto que o mercado resolve), a Europa que substituiu o direito ao trabalho pelo direito de trabalhar, como se a Revolução Francesa não tivesse vindo proclamar, há mais de 200 anos, que todos os homens são livres, mesmo os trabalhadores (e por isso têm o direito de trabalhar);

- a Europa que só se preocupa em garantir “mercados de trabalho que reajam rapidamente às mudanças económicas”, isto é, mercados de trabalho flexíveis, em que os patrões possam fazer o que lhes der na real gana (para isso inventaram essa coisa bizarra que dá pelo nome de flexigurança, que põe em causa a segurança do trabalho e o trabalho com dignidade);

- a Europa que, construída sob a invocação beata do modelo social europeu, acabou por se transformar, para os povos europeus, como observou Bernard Cassen, num verdadeiro “cavalo de Tróia da globalização neoliberal”, empenhado em liquidar os sistemas públicos de saúde e os sistemas públicos de segurança social;

- a Europa que desprezou por completo as políticas sociais, afirmando-se como Europa do capital à custa da Europa social, certamente por acreditar, com Michel Rocard, em que “as regras do jogo do capitalismo internacional sancionam qualquer política social audaciosa” e em que, “para fazer a Europa, é preciso assumir as regras deste jogo cruel”; certamente por acreditar, com Tony Blair, que a justiça social só pode resultar do aumento da eficiência e dos lucros, ideia que se traduz no texto dos Tratados na afirmação do princípio de que a harmonização dos sistemas sociais só pode resultar do “funcionamento do mercado interno”;

- a Europa que, a partir do Tratado de Amesterdão, baniu do texto dos Tratados, a referência à harmonização do direito social no sentido do progresso, deixando bem claro que o objectivo, como a vida mostra, é o do nivelamento por baixo, em matéria de salários, de garantias de emprego, de segurança no trabalho, de protecção aos desempregados e aos aposentados, de direitos sociais, de defesa do ambiente.

6. - Pois bem. Dizendo-se agora neoliberais por imperativo da moda, continuam a defender a Europa neoliberal, e a falecida Constituição Europeia e o nascituro Tratado de Lisboa, talvez por uma questão de coerência ou por não quererem enjeitar o filhote que deram à luz, apesar de ele ser um patinho feio…

No que nos diz respeito, queremos dizer, com toda a clareza, a todos os portugueses e também àqueles que nos acusam de sermos contra a Europa, de sermos anti-europeus: somos europeus, sim senhor! Somos pela Europa, sim senhor!

Mas somos contra a Europa neoliberal que, através de um verdadeiro “golpe de estado ideológico” (como lhe chamou uma autora francesa), quiseram constitucionalizar (na esperança de assim a tornar mais eterna) e que, morta a dita Constituição Europeia por força do voto popular, querem agora impor aos povos da Europa, sem lhes perguntarem a opinião (gato escaldado de água fria tem medo…).

Como milhões de europeus, entendemos que a questão decisiva reside em saber que Europa que queremos.

Pois bem. Nós não queremos a Europa que eles construíram.

Os europeus e o mundo inteiro precisam de uma outra Europa,
- uma Europa governada por princípios de solidariedade social e não a Europa orientada pela livre concorrência, que aceita (resignada...ou exultante...) a “violência da concorrência”, “sem regulação nem limite”;
- uma Europa dos direitos sociais e do progresso social e não a Europa da precariedade do trabalho, da desigualdade crescente, da exclusão social, que quer fazer andar duzentos anos para trás o relógio da história;
- uma Europa livre de tutelas e capaz de definir os seus objectivos na cena internacional e não a Europa de joelho dobrado perante o império norte-americano; uma Europa dos cidadãos e dos trabalhadores, e não a Europa dos negócios e do capital financeiro;
- uma Europa (e um mundo), em suma, em que o mercado não substitua a política, a concorrência não substitua a cidadania, a eficiência e a competitividade não substituam o direito e a justiça.

Para tanto, é imperioso que a União Europeia, enquanto comunidade de estados soberanos e iguais, seja uma comunidade de povos e de culturas, uma comunidade de afectos, coesa e solidária, uma comunidade de valores democráticos, acima de tudo fiel a um dos objectivos estratégicos iniciais, uma comunidade de paz, uma comunidade promotora da paz, através do combate ao subdesenvolvimento, ao racismo, à xenofobia, à pobreza, à exclusão.

Por esta Europa se vem batendo a CDU!

Por esta Europa nos bateremos na campanha eleitoral que se aproxima!

VIVA A CDU! VIVA PORTUGAL!

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