Reforçar a CDU na Assembleia da República

André Levy
 

André Levy

Quantas vezes os militantes e apoiantes do PCP e da CDU não ouvem: "eu até concordo com vocês, e admiro o vosso trabalho, mas vocês não vão lá ...". Não vão lá? Lá, aonde? Este tipo de discurso revela desde logo um incompreensão do teor das eleições legislativas que se aproximam. Revela aquilo que os partidos do Bloco Central, com a cumplicidade da comunicação social, tendem a promover: que as eleições para a composição dos 230 membros da Assembleia da República (AR) são na verdade eleições para o governo, ou mesmo eleições para Primeiro-ministro.

A esta descaracterização das eleições legislativas acresce a pressão, de novo do Bloco Central e seus porta vozes, de que o país precisa de estabilidade e governabilidade. Atrevo-me a dizer que o país precisa precisamente que não haja uma nova maioria absoluta. A história recente da nossa democracia vem demonstrando que os governos sustentados por uma maioria absoluta da AR tendem a diminuir o papel deste órgão, que pelo pluralismo de forças ali pressentes mais estreitamente representa, a nível nacional, as vontades e aspirações dos eleitores. O órgão capaz de fiscalizar e confrontar o governo, através das suas Comissões, dos requerimentos e perguntas.

O partido da maioria na AR assume uma atitude de enorme arrogância, chumbando a maior parte dos projectos de lei das restantes forças parlamentares, por mais mérito que tenham. Excepção a esta regra são as leis mais lesivas para o país, que unindo os grupos representantes da política de direita, aprovam leis que reduzem o papel dos serviços públicos, protegem os interesses do capital e atacam os trabalhadores. O executivo assume a mesma arrogância, reduzindo o diálogo com os parceiros sociais, ou limitando-o a mera fachada, e avança com as suas políticas mostrando desdém pelas forças sociais que resistem aos ataques aos seus direitos. O governo caracteriza estas forças como de atraso, que defendem interesses corporativas, como se o governo não estivesse a defender os interesses do grande capital nacional e internacional, e dando razão ao cartaz sindical que afirma "Maiorias absolutas, destroem direitos". Se a estabilidade fosse um bem absoluto, quase que somos levados a concluir que os 48 anos do período fascista foram os anos de melhor governabilidade.

A verdade é que o país desta fase precisa que nenhum partido, em particular do PS ou PSD, atinjam uma maioria absoluta. Precisa, sim, de um reforço das forças de esquerda, e em particular um reforço da CDU. Voltando ao cliché enunciado no início, a CDU chega lá, à AR. E aí destaca-se como força determinada e coerente. Os grupos parlamentares do PCP e do PEV destacam-se pela qualidade e quantidade de trabalho parlamentar, através da apresentação de propostas alternativas. Que estas não recebam o destaque público devido, leva muitos eleitores a acusar estas forças como meras forças de oposição e crítica, que não apresentam alternativas, quando tal não poderia estar mais longe da verdade. Os deputados do PCP destacam-se também por não serem beneficiados nem prejudicados pelo seu trabalho parlamentar, sendo imunes às acusações genéricas que os deputados só procuram o tacho.

A próxima AR precisa de reforçar as vozes empenhadas não apenas numa alternância, na mudança de fachada, mas numa verdadeira ruptura com a política de direita, com força para fiscalizar e confrontar o governo. Este reforço é tão mais importante na medida em que a próxima sessão legislativa irá considerar a revisão da Constituição da República Portuguesa, cuja alteração necessita de uma maioria de dois terços.