O Estado da Nação

José Casanova
 

José Casanova

Sobre o «gesto» de Manuel Pinho muito se disse, como era inevitável. E, como era inevitável, muito ficou por dizer.

Com efeito, aquilo prestava-se às abordagens brincalhonas, aos sub-entendidos pícaros, às alusões mais ou menos veladas, a que foi sujeito.

Contudo, a profusão desse tipo de abordagens desviou as atenções de outros aspectos, porventura bem mais significativos, que o «gesto» encerrava.

Ao fim e ao cabo, aquele «gesto», no seu significado mais profundo, reflecte bem o estado da Nação que ali estava a ser debatido, ou seja, o estado a que isto chegou após mais de três décadas de arremetidas de uma política frontalmente contrária aos interesses dos trabalhadores, do povo e do País e frontalmente ao serviço dos interesses do grande capital.

Sublinhe-se que Manuel Pinho não se limitou a, de dedos na testa e ar enraivecido, responder ao aparte do deputado do PCP. Ao mesmo tempo que ostentava uma incontrolável vontade de arremeter, ele gritava, ameaçador: «Tu estás tramado, pá!».

E há neste grito um claro aviso, uma ameaça inequívoca, bem na linha, aliás, da prática arrogante, autoritária, prepotente, amiúde desembocando no desrespeito pelos princípios democráticos, que tem caracterizado o Governo PS/José Sócrates – que é a mesma prática, mais coisa menos coisa, a que todos os governos de política de direita têm vindo a recorrer, desde o longínquo governo PS/Mário Soares até ao actual PS/José Sócrates, passando por todos os outros, do PS ou do PSD, que ao longo dos últimos trinta e três anos têm sido os executantes dessa política de direita comum aos dois.

Na verdade, como a realidade nos tem mostrado, todos os passos em frente dados por todos os governos executantes dessa política, só foram possíveis na base do autoritarismo, da prepotência, do roubo de direitos, liberdades e garantias democráticas, do desrespeito pela Constituição da República Portuguesa

É assim que têm vindo a proceder à destruição do aparelho produtivo; ao encerramento de centenas e centenas de empresas; ao aumento do desemprego e à proliferação desse outro brutal atentado aos direitos dos trabalhadores que é a precariedade; aos salários baixos e aos salários em atraso; às pensões e reformas de miséria; ao aumento das desigualdades sociais, da pobreza, da miséria, da fome – para além da venda a retalho da soberania e da independência nacional, com a subserviência rastejante aos ditames do imperialismo e o envolvimento de Portugal em guerras de ocupação e em bárbaros morticínios.

Ora, o «gesto» e as palavras ameaçadoras do ex-ministro Manuel Pinho são parte integrante da política de direita e nesse sentido pode dizer-se que, com todo o seu significado, constituíram uma exuberante amostra do estado da Nação.

De tudo isto, emerge a necessidade imperiosa da substituição desta política por uma política de esquerda – que inicie o combate às malfeitorias praticadas durante três décadas e restitua aos portugueses o orgulho de o serem - e de se reverem no estado da Nação.

E não há volta a dar-lhe: só com o reforço eleitoral da CDU lá chegaremos.